ODONTOLOGIA - BREVE HISTÓRICO



 Maquinário dentário formado por 
um conjunto de roldanas.
Museu do Dentista, SP


Ricardo Henrique Alves da Silva*, Arsenio Sales-Peres**
*Doutorando em Odontologia Social - FO/USP, 
Professor de Odontologia Legal e Medicina Legal - UNIP/BAURU
**Professor Livre-Docente de Deontologia e Odontologia Legal - FOB/USP






Resumo
O presente trabalho baseia-se em uma revisão da literatura, abordando os aspectos históricos referentes à consolidação da Odontologia como profissão regulamentada, assim como uma reflexão crítica a respeito das características deste exercício profissional e seu embasamento. Devido a uma falta notadamente sentida por parte da literatura científica a respeito da história da Odontologia, o objetivo deste trabalho é trazer ao profissional e ao estudante de Odontologia noções sobre a estruturação da profissão, passando pelas etapas de profissionalização e as regulamentações específicas. Conclui-se pela necessidade de um maior conhecimento e, conseqüentemente, discussão a respeito da profissão odontológica, seus problemas e desafios.

Abstract
The present study is based on a literature review, broaching the historical aspects in relation to Dentistry consolidation as regulamented profession, as well as a critical reflexion about this professional exercise characteristics and its embaying. Due to a lack in scientifical literature about Dentistry history, the aim of this research is to bring to Dentistry’s professional and student some knowledge about the professional building, broaching the professionalization stages and specifically legislation. It’s possible to conclude that there’s a necessity of a bigger understanding and, therefore, discussion about the Dentistry profession, its problems and challenges.

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Odontologia: Um breve histórico

INTRODUÇÃO
Como em toda profissão, a Odontologia também possui suas peculiaridades no tocante ao seu desenvolvimento, sendo de fundamental importância a explanação desses pontos a fim de possibilitar a compreensão do atual posicionamento da profissão, bem como o entendimento e elucidação de seus problemas.

Cunha12 (1952) relata que a trajetória da Odontologia fez-se como um grande rio: nasceu na Mesopotâmia, ganhou o velho Egito e correu até o Mediterrâneo, atravessou-o chegando à Grécia, inflectiu-se depois até Roma de onde seguiu para a Península Ibérica, chegou à França, Alemanha e Inglaterra e transpôs o Oceano Atlântico, espraiando-se pela América, sendo que nesse longo curso de alguns milênios, foi recebendo, em seu demorado percurso, afluentes importantes, lançando braços nas mais variadas direções, até chegar ao colosso admirável da atualidade.

A Odontologia, denominada em seus primórdios como Arte Dentária, nasceu na Pré-História, porém seus registros mais antigos datam de 3500 a.C., na Mesopotâmia, onde é possível observar, nas inscrições da época, uma menção do que seria o verme responsável pela destruição da estrutura dentária, o gusano dentário18.

Rosenthal18 (2001) expõe que assim como na Medicina, as afecções de competência da Odontologia eram tratadas por meio da religião e da magia, sendo utilizada orações e fórmulas para destruir tal verme:

“Que me darás de comer, que me darás para destruir? 
Te darei figos maduros e a carne de figos grandes.
Na verdade que são para mim estes figos grandes e maduros?
Levanta-me e deixa-me residir entre os dentes e gengivas,
de modo que eu possa sugar o sangue do dente e corroer a cartilagem das gengivas.
Posto que tenha dito isto, gusano, que EA te golpeie com a força de seu punho.
Este é o ritual mágico.
Misture cerveja, azeite e planta de sa-kil-bir, 
coloque no dente e repita a invocação três vezes”.


Almeida, Vendúsculo e Mestriner-Junior(2002) delimitam que a profissão odontológica foi construída no decorrer dos tempos, primeiramente exercida por sacerdotes e médicos para, a seguir, ser relegada às mãos de charlatões, até encontrar um segmento profissional que se dedicasse a ela.

Medicina e Odontologia no início dos tempos

Dentro de uma incursão histórica aos primórdios da Odontologia, torna-se praticamente impossível estabelecer uma divisão concreta entre a Medicina e a Odontologia.

Essa impossibilidade explica-se pelo fato de que na história das ciências médicas, tanto a Medicina, enquanto Ciência Mater, quanto a Odontologia, que teve nela seus primórdios, nasceram em épocas pré-históricas, quando o homem primitivo teve suas primeiras dores.

As primeiras documentações terapêuticas sobre as infecções da cavidade bucal, de acordo com Rosenthal18 (2001), são encontradas nos papiros egípcios, sendo que a Medicina egípcia pode ser situada entre a concepção demoníaca e sobrenatural dos povos mesopotâmicos e a interpretação racional e científica que nasceu da escola de Hipócrates.

Mais recente que a egípcia, a Odontologia na velha Grécia apresenta-se através de duas figuras: Asclépio, o deus da Medicina e Hipócrates, o fundador da Medicina Científica12 (2002) expõem que Hipócrates, o “Pai da Medicina”, escreveu, em seus estudos, aspectos relacionados à Odontologia, tais como a doença cárie dentária, a má-oclusão, os abscessos entre outros.

Para a formação da Arte Dentária Romana, há a colaboração grega e egípcia, sendo de notável importância a Lei das XII Tábuas, cerca de quatro séculos antes de Cristo, onde havia permissão para o emprego do ouro em trabalhos dentários, sendo o mesmo negado para outros fins12.

Com o decorrer dos tempos, a Odontologia entra em sua era pré-científica, ampliando horizontes e possibilitando grandes perspectivas. Surgem as publicações, onde são exploradas questões sobre a Odontologia e sua relação com outras afecções, bem como o conhecimento do corpo humano através dos grandes anatomistas12. E, dentro deste contexto, a Europa foi considerada o berço da Odontologia, onde surgiram os primeiros relatos desta ciência, a partir do século XVI1.

A fase científica da Odontologia é realmente descortinada com Pierre Fauchard, considerado o “Pai da Odontologia”, no século XVIII, iniciando sua carreira como cirurgião e dedicando- se, em seguida, integralmente a Odontologia, publicando uma obra notável, Le Chirugien Dentiste – Au Traité des Dents12.

E, finalmente, no século XIX, a Odontologia projeta-se, chegando à América, devido a três eventos importantes, todos nos Estados Unidos da América: a fundação da Society of Dental Surgeons em Nova York;; a criação da primeira escola especializada na prática dental da América, a Escola de Odontologia de Baltimore;; a publicação do primeiro jornal especializado, The American Journal of Dental Science1.


História da Odontologia no Brasil

A Odontologia, conforme demonstrada nos parágrafos anteriores, passou por uma longa evolução até chegar a sua fase científica e propiciar a população um atendimento de qualidade e responsável. No Brasil, não poderia ser diferente e alguns aspectos se fazem interessantes no decorrer de sua história.

Ao se referir ao Período pré-colonização, relata-nos Cunha12 (1952), que quase nada poderia ser dito sobre a Odontologia na época pré-colombiana, devido ao estado rudimentar de civilização, sendo que os habitantes encontrados por Pedro Álvares Cabral, na então denominada Terra de Vera Cruz, tinham um grau primitivo de civilização, sendo natural que pouco ou quase nada se saiba sobre a sua Odontologia.

É interessante, contudo, ressaltar o relato feito por Pero Vaz de Caminha, que relata o ato de uma possível lavagem da boca por dois índios que foram levados a bordo da nau capitânia, após terem ingerido alguma coisa oferecida pelos portugueses12:

“...deram-lhe aly de comer pam e pescado cosido, confeitos, fartees, mel e figos passados;; nom quizeram;; nom quizeram comer d’aquillo casy nada, e alguma cossa, se a provavam, lançavam-na logo fora. Trouveram-lhes vinho
por huã taça, pozeram-lhe asy a boca tammalavês e nom gostaram d’elle nada, nem o quizeram mais;; trouveram-lhes agoa per humã albarada;; tomaram d’ela senhos bocados e nom beberam;; somente lavaram as bocas e lançaram fóra”

O Brasil teve, a partir do seu processo colonizador, a vinda de pessoas capacitadas nas mais diversas ocupações, a fim de propiciar serviços e cuidados aos colonizadores.

Cunha12 (1952) discorre que havia uma carência para os habitantes de mestres de todos os ofícios, sendo que o licenciamento de alguns destes profissionais estava dependente do cirurgião-mor.

Porém, Calvielli(1993) expõe que foram poucos os que vieram, não atraindo, evidentemente, os melhores profissionais da Península Ibérica, sendo a maioria composta de cirurgiões- barbeiros.

Nobre17 (2002) relata que, com a frota de Pedro Álvares Cabral veio o cirurgião Mestre João, sendo que, ao desembarcarem no litoral da Bahia em 1500, os portugueses já traziam da Europa técnicas curativas e de extração dentária.

Já no século XVII surge a primeira legislação portuguesa referente à Odontologia, a Carta Régia de Portugal, de 09 de Novembro de 1629, regularizando a prática da arte dentária, sendo instituída uma multa de dois mil réis às pessoas que “tirassem dentes” sem licença e, pela primeira vez citando a “classe profissional” dos barbeiros18.

Conforme relata Cunha12 (1952), é interessante lembrar que o termo dentista ainda não é presente, havendo alusão, na época, apenas ao termo barbeiro que, conforme o Novo Dicionário da Língua Portuguesa, de autoria de Eduardo de Faria, em 1859, referia-se como:

“Barbeiro – s.m. o que faz barba – (antigo) sangrador, cirurgião pouco instruído que sangrava, deitava ventosas, sarjas, punha cáusticos e fazia operações cirúrgicas pouco importantes”

Ainda no século XVII, Gomes Freire de Andrade sanciona um Regimento ao Cirurgião Substituto das Minas Gerais, com a autorização de Sua Majestade, podendo ser considerada, em parte, como uma primeira legislação brasileira frente ao ofício da Arte Dentária18.

No século XVIII, um fato de notável importância no período foi a extinção dos cargos de Cirurgião-Mor e Físico-Mor para a criação da Real Junta de Protomedicato, pela Rainha de Portugal, D. Maria I, em 17 de Junho de 1782. As licenças e cartas passaram a ser emitidas por tal órgão que era composto de sete deputados, médicos e cirurgiões aprovados e possuindo mandatos com duração de três anos12, 18.

Calvielli(1993) descreve que como não vinham novos cirurgiões de Portugal ou porque a demanda tivesse aumenta- do, a “arte de tirar dentes” foi sendo assumida pelos escravos e pelos negros alforriados, sendo considerada uma atividade menos importante.

Rosenthal18 (2001) ressalta que essa presença do negro na prática odontológica não era bem vista pelos portugueses, mas que o Reino fazia, excepcionalmente essa concessão, a fim de que pudessem atender outros escravos e pessoas carentes.

Posteriormente, com a vinda da corte de Portugal para o Brasil em 22 de Janeiro de 1808, ocorre um surto de progresso nas mais diversas áreas, dentre elas a Odontologia. Alguns fatos relatados por Rosenthal18 (2001)merecem destaque:

* Cria-se, em 18 de Fevereiro de 1808, a Escola de Cirurgia da Bahia, no Hospital São José;;
* A extinção da Real Junta do Protomedicato, em 07 de Janeiro de 1809, retornando o controle das licenças para o Físico-Mor e para o Cirurgião-Mor;
* Expedição, em 15 de Fevereiro de 1811, da primeira Carta de Dentista no Brasil em nome de Pedro Martins de Moura (português) e, em 23 de Julho de 1811, em nome de um brasileiro, Sebastian Fernandez;
* Os dentistas franceses se destacaram de 1820 a 1850, porém, a partir de 1840, começam a chegar dentistas dos Estados Unidos da América, principalmente durante o período referente à Guerra da Secessão (1861-1865), os quais rapidamente passam a suplantar os franceses.

A partir desse desenvolvimento tecnológico e cultural, começam a surgir os primeiros passos para se estabelecer a formação em Odontologia.

Em 19 de Abril de 1879, o artigo 24 do Decreto no 7.247 determinava18:

“A cada uma das faculdades de Medicina ficam anexos: uma Escola de Farmácia, um Curso de Obstetrícia e Ginecologia e um outro de Cirurgia Dentária”

O Decreto no 8.024, de 12 de Março de 1881, no artigo 94 do Regulamento para os Exames das Faculdades de Medicina diz18:

“Os cirurgiões-dentistas que quiserem se habilitar para o exercício de sua profissão passarão por duas séries de exames: o primeiro de anatomia, fisiologia, histologia e higiene, em suas aplicações à arte dentária. O outro, de operações e próteses dentárias.”

A partir de então ocorre a entrada na luta pela conquista do monopólio da intervenção na área bucal pelos diplomados, iniciada com a institucionalização dos cursos de Odontologia anexos às faculdades de Medicina, pelo Decreto no 9.311, de 25 de Outubro de 1884, denominada Reforma Sabóia9, sen- do, por este motivo, utilizada a data de 25 de Outubro como comemoração do Dia do Cirurgião-Dentista no Brasil.

Calvielli(1993) expõe, ao realizar uma incursão histórica em sua dissertação de mestrado, que os fatos históricos referentes à Odontologia tornam-se lacunosos após o século XIX, referindo-se, quase que exclusivamente, ao levantamento das legislações criadas, relatando alguns fatos que propiciaram a consolidação da Odontologia enquanto profissão, tais como:

* A tentativa de extinção do curso de Odontologia da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro;;
* A criação da Escola Livre de Odontologia, pelo Instituto Brasileiro de Odontologia do Rio de Janeiro;;
* A Escola de Farmácia, Odontologia e Obstetrícia de São Paulo.

Legislações nacionais e a profissão odontológica 

A partir do século XX ocorre um rápido avanço da ciência odontológica no Brasil, sendo criadas as primeiras faculdades de Odontologia, porém ainda tendo a presença de “práticos” na profissão.Neste momento, legislações específicas são redigidas com o intuito de regularizar o exercício da Odontologia, impedindo a formação de novos “práticos”.

Calvielli(1997) relata que em 04 de Dezembro de 1933 foi expedido o Decreto no 23.540, o qual fixava a data de 30 de Junho de 1934 como a data limite para a concessão de licença aos práticos em exercício, denotando as primeiras medidas efetivas para a monopolização do exercício da Odontologia pelos portadores de diploma de curso superior.

Sendo assim surge, finalmente, a primeira regulamentação do exercício profissional da Odontologia através da Lei no 1.314, de 17 de Janeiro de 19517, 15:

“Art. 1o. – O exercício da profissão de odontologista no território nacional só será permitida aos que se acharem habilitados por título obtido em Escola de Odontologia, oficial- mente ou legalmente reconhecida, devidamente registrado na Diretoria do Ensino Superior e anotado, sucessivamente, no Serviço Nacional de Fiscalização da Medicina e na repartição sanitária estadual competente.”

bem como as instruções reguladoras pela Portaria no 101, de 28 de Junho de 1951(Brasil, 1951):

“O Diretor Geral do Departamento Nacional de Saúde, no uso de suas atribuições legais, resolve aprovar as instruções anexas que regulamentam a Lei no 1.314 de 17 de Janeiro de 1951, de conformidade com o artigo 18 da referida lei”

A próxima etapa de evolução profissional foi a instituição do Conselho Federal e Conselhos Regionais de Odontologia, através da Lei no 4.324, em 14 de Abril de 19645.

Conforme ressalta Calvielli(1993), três anos depois de sua criação, os Conselhos ainda não haviam sido instalados devido aos desentendimentos entre as várias facções da classe odontológica.

Após tantas turbulências na conformação profissional da Odontologia, a classe recebe em 24 de Agosto de 1966, a Lei no 5.0816, que regulamenta o exercício da Odontologia em todo o território nacional e vem para substituir a Lei no 1.314 de 17 de Janeiro de 19517, 15.

Passa a Odontologia a ser, definitivamente, uma profissão, isto é, uma atividade especializada, de caráter permanente, em que se desdobra o trabalho total realizado em uma sociedade16.

A partir de então se observa um rápido crescimento da profissão, exemplificado pela abertura de inúmeros cursos de graduação e pós-graduação, bem como um grande salto científico e tecnológico.

Odontologia e as etapas de profissionalização: fazendo a história

Chaves10 (1986) expõe que cinco etapas distintas de profissionalização podem ser identificadas como:

1) Etapa de ocupação indiferenciada;;
2) Etapa de diferenciação ocupacional;;
3) Etapa inicial de profissionalização;;
4) Etapa intermediária de profissionalização;; 

5) Etapa avançada de profissionalização.

A etapa de ocupação indiferenciada trata-se da forma mais antiga, onde ainda não existem indivíduos na comunidade dedicados exclusivamente à prática odontológica, sendo a mesma exercida por curandeiros e outros indivíduos da comunidade10.

Rosenthal19 (1998) apresenta a existência de métodos de tratamento baseados em produtos de origem vegetal (retirar o azeite de meio coco e passar sobre o dente dolorido; aplicar pimenta do reino sobre o dente dolorido), origem animal (passar cera de ouvido de cachorro sobre o dente dolorido), produtos químicos de origem caseira (passar sobre o dente dolorido um algodão embebido em creolina), dentre outros.

E, apesar de ser a modalidade mais antiga, ainda é observada em localidades do Brasil, como exposto por Silva et al.21 (2004), em trabalho realizado no interior do Estado de Rondônia com o objetivo de conhecer os diferentes aspectos culturais referentes à saúde bucal, encontrando modalidades de tratamento alternativas relatadas pelos moradores da localidade como “para dor de dente eu coloco uma bolinha de algodão com óleo de copaíba” e “queria arrancar os dentes para parar de doer”.

A etapa de diferenciação ocupacional pode ser caracterizada quando o indivíduo se especializa, ou seja, a Odontologia constitui sua ocupação principal, porém o ofício é aprendido de outros indivíduos, sem cursos formais10.

Nos dias de hoje, se encontrado este tipo de modalidade, há o enquadramento como exercício ilegal da profissão e ainda é presente em nossa sociedade, sendo que recentemente dois falsos dentistas foram detidos na Zona Leste da capital paulista13.

Na terceira etapa ou etapa inicial de profissionalização, o grupo que exercia a profissão, buscando melhorar o seu nível, decide organizar cursos para os que nela desejarem ingressar. É nesta etapa que tem início, conforme explorado anteriormente, as primeiras lutas do pessoal profissional, buscando estabelecer uma legislação restritiva, ou seja, um monopólio de atuação10.

A próxima etapa, a intermediária de profissionalização, apresenta um aumento de duração dos cursos de formação profissional. Ao mesmo tempo, as associações profissionais tornam-se mais fortes pelo aumento do número de seus membros e, conseqüentemente, há o aumento do antagonismo entre dentistas e práticos10.

Ainda na quarta etapa há o aparecimento de profissões subsidiárias, tais como o assistente ou auxiliar de consultório e o protético, porém já fica delimitada que a intervenção na cavidade bucal é função única e exclusiva do cirurgião-dentista10.

Na quinta e última etapa, a etapa avançada de profissionalização, a Odontologia alcança uma posição bastante elevada. A profissão é capaz de controlar os seus membros de forma muito mais eficiente e a atividade ilícita profissional praticamente desaparece10.

É a partir da quinta etapa que o ensino de pós-graduação se desenvolve formalmente através das universidades, bem como as especializações e, desta maneira, a Odontologia configura-se como uma profissão perfeitamente estruturada na sociedade10.

A Pós-Graduação acima relatada é entendida, de acordo11
com Consolaro (2000), como cursos para profissionais com graduação completa e que desejam continuar seus estudos regulares com vista a obter um grau e/ou título superior, tendo como objetivo imediato proporcionar o aprofundamento do saber que permita alcançar elevado padrão de competência científica ou técnico-profissional impossível de ser obtido apenas no
âmbito da graduação.

Assim, conforme destaca Botazzo(2000), a história da
Odontologia foi determinante para a formação da identidade profissional, pois supõe-se uma proximidade da Odontologia com a Arte Dentária praticada pelos barbeiros a partir da Antigüidade, preservada durante a Idade Média e em crise após a Revolução Industrial, em uma espécie de sucessão de descobertas acidentais e de evolução “natural” de um praticante, marcado pelo estigma do existir separado das outras práticas de saúde.

E, apesar de toda esta evolução, atualmente vem sendo de grande preocupação o mercado de trabalho referente à profissão odontológica, visto que está cada vez mais repleto de profissionais e, em contrapartida, com os consultórios cada vez mais vazios.

Além disso, a Odontologia brasileira chega ao final do século XX carregando uma impostergável contradição: apesar da evolução técnica que a área experimentou, seus alcances sociais continuam sendo mínimos, o que torna cientificamente questionável sua prática14.

Conseqüentemente, os ganhos de mercado têm tomado rumo pouco animador para todos, sendo necessário adaptar- se aos novos tempos, onde ser apenas um bom profissional bastava, e tornar-se um profissional que supera o padrão de referência20.

Considerações finais
Observa-se, desta maneira, que a Odontologia passou por diversas etapas a fim de chegar à estrutura profissional hoje conhecida, apresentando, como qualquer outra profissão problemas e desafios a serem enfrentados e vencidos através de uma atuação forte e decidida por parte de seus militantes.

Sendo assim, devem os profissionais de Odontologia, suas entidades e seus professores buscar formar um profissional, conforme o descrito pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Odontologia(2002): “profissional com formação generalista, humanista, crítica e reflexiva, para atuar em todos os níveis de atenção à saúde, com base no rigor técnico e científico. Capacitado ao exercício de atividades referentes à saúde bucal da população, pautado em princípios éticos e legais e na compreensão da realidade social, cultural e econômica do seu meio, dirigindo sua atuação para a transformação da realidade em benefício da sociedade”.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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2. Botazzo C. Da arte dentária. São Paulo;; Editora Hucitec, Fapesp;; 2000.
3. Brasil. Diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em Odontologia. 2002.
4. Brasil. Lei no. 1.314: regulamenta o exercício profissional dos cirurgiões-dentistas. 17 jan. 1951.
5. Brasil. Lei no. 4.324: institui o conselho federal e os conselhos regionais de odontologia, e dá outras providências. 14 abr. 1964.
6. Brasil. Lei no. 5081: regula o exercício da odontologia. 24 ago. 1966.
7. Brasil. Portaria no. 101: instruções reguladoras da lei no 1.314 de 17 de janeiro de 1951, que rege o exercício da odontologia. 28 jun. 1951.
8. Calvielli ITP. Exercício lícito da odontologia no Brasil. In: Silva M. Compêndio de odontologia legal. Rio de Janeiro: Medsi; 1997. p.3-13.
9. Calvielli ITP. O exercício ilegal da odontologia, no Brasil. São Paulo, 1993 (dissertação de mestrado). São Paulo: Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo;; 1993.
10. Chaves M. Odontologia social. 3a. ed. São Paulo;; Artes Médicas;; 1986. 448p.
11. Consolaro A. O “Ser” Professor: arte e ciência no ensinar e aprender. Maringá;; Dental Press International;; 2000.
12. Cunha EMS. História da odontologia no Brasil. 2a ed. Rio de Janeiro;; Científica;; 1952.
13. Falsos profissionais são denunciados ao CROSP. Novo CROSP – Órgão oficial do Conselho Regional de Odontologia
14. Garrafa V, Moysés SJ. Odontologia brasileira: tecnicamente elogiável, cientificamente discutível, socialmente caótica. Divulgação Saúde Debate 1996; 13:6-17.
15. Giachetti NJ. Preceitos legais que interessam ao exercício da Odontologia. São Paulo;; Lysanda;; 1960.
16. Meira AR. Cultura e especialização. In: Interlandi S. Ortodon- tia: bases para a iniciação. 3a. ed. São Paulo: Artes Médicas;; 1994. p.419-22.
17. Nobre MAS. Fiscalização profissional: da punição à prevenção. Revista Brasileira de Odontologia 2002;; 59(4):222-3.
18. Rosenthal E. A odontologia no Brasil no século XX. São Paulo; Santos; 2001.
19. Rosenthal E. Os dentes e o folclore no Brasil. São Paulo;; Ysayama;; 1998.
20. Sales-Peres A. O mercado de trabalho: odontologia. INFOB – Informativo da Faculdade de Odontologia de Bauru 1999; 1(2):3.
21. Silva RHA, Castro RFM, Sales-Peres SH de C, Sales-Peres A, Bastos JR de M. Antropologia cultural e saúde pública: desafios na promoção de saúde. Revista Odontologia e Sociedade 2004;; 6(1):54.

Por Ricardo Henrique Alves da Silva page5image37712 page5image37872 page5image38032 page5image38192page5image38352
Recebido para publicação em 27/11/2006 Aceito para publicação em 04/01/2007
Odontologia. Clín.-Científ., Recife, 6 (1): 7-11, jan/mar., 2007 www.cro-pe.org.br 



Dentistry: A historical brief
Ricardo Henrique Alves da Silva*, Arsenio Sales-Peres**
*Doutorando em Odontologia Social - FO/USP, 
Professor de Odontologia Legal e Medicina Legal - UNIP/BAURU

**Professor Livre-Docente de Deontologia e Odontologia Legal - FOB/USP

Artigo de Revisão / Review Article Silva, R.H.A.; Sales-Peres, A.
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Descritores
Odontologia; história; educação; legislação.
Key-words
Dentistry;; history;; education;; law.

Correspondência para / Correspondence to:Ricardo Henrique Alves da Silva
Rua Minas Gerais, 12-67- Parque Paulistano,- Bauru-SP - CEP: 17030-511 / E-mail: ricardohenrique@usp.br

Odontologia. Clín.-Científ., Recife, 6 (1): 7-11, jan/mar., 2007 www.cro-pe.org.br




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